segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Nove

O vento deslocou as pontas roxas do meu cabelo na frente da câmera, e eu esperei até que passasse. Eu lentamente segui o corpo galopante de Josh ao redor da pista, dando zoom enquanto ele curvava a virada e eu conseguia ver seu rosto. Ele inalou, e eu tirei a foto, imediatamente deslocando a câmera do meu olho para ver o que eu tinha captado no visor.

Eu não conseguia evitar sorrir. Ele parecia adequadamente torturado, os olhos apertados e a boca aberta.

O suor fazia seu cabelo grudar na sua testa. Atrás dele estavam as formar borradas e coloridas dos outros corredores. No fundo dianteiro havia uma bola brumosa de luz que qualquer outra pessoa diria que era um artefato da câmera, mas eu sabia que era a Grace. Josh ficaria feliz de ver uma evidência dela.

O som de pés correndo chamaram a minha atenção. “Está bonito, Josh!” eu gritei, e eu consegui um aceno breve em retorno. Ele não estava tão cansado quanto a foto indicava. E não era uma corrida. O time de corrida está só se certificando que alguém estava no campo o tempo todo, meio que uma maratona o dia todo. Do lado de fora da pista estava um grupo de não-atletas que se movia muito mais devagar

Era um evento social tanto quanto qualquer outro, e eu conseguia ouvir as mulheres falando sobre seus filhos enquanto andavam rápido carregando pesos, ganhando dólares por volta para ajudar a comprar um novo ônibus de atividade.

Eu levantei minha câmera e tirei uma foto quando uma das mulheres riu, capturando-a em um instante de felicidade. Seus distintivos de participantes estavam claramente visíveis, e eu brinquei com a ideia de mostrar isso para a Srta. Cartwright para ver se ela queria usar isso na promoção do ano que vem.

Virando, eu avistei o time de corrida feminino da Covington High se alongando sob a sombra das bétulas.

Distintivos coloridos de ginástica sujavam a grama, e eu tirei algumas fotos, me certificando que Amy não estava em seu melhor. Dando zoom, eu foquei na bandagem sobre seu nariz roxo, machucado e inchado, graças a Grace, e com um sorriso, eu tirei uma realmente ruim com a boca dela aberta.

“Nunca irrite o fotógrafo,” eu sussurrei, me sentindo bem sobre capturá-la em mais do que uma pose estranha e desfavorável.

Eu estivera tirando fotos agora por três horas e eu estava começando a ficar cansada, mesmo enquanto os meus músculos fotográficos há muito inaproveitados curtiam o exercício. O cartão da câmera que eu tinha comprado ontem fora uma dádiva dos deuses. Eu já o tinha enchido uma vez, tirando tempo para jogar tudo
na impressora antes de limpa-lo e voltar a procurar mais momentos oportunos.

“Como esse,” eu sussurrei quando vi um homem segurando sua filha perto e alto de seu rosto.

Ele estava apontando para um dos transeuntes no campo, e o bebê, uma garota pelo laço e franjas, estava seguindo seu olhar. O rosto do homem brilhava enquanto ele falava com sua filha. Atrás deles vinha um carrinho de bebê com uma enorme sacola de fraldas enfiada debaixo dele e um punhado de brinquedos presos na barra fronteira.

Eu tirei uma foto do carrinho de bebê só porque eu achei que era legal que algo tão pequeno precisasse de tanta coisa, então me foquei no homem e em sua filha, esperando até que a garotinha reconhecesse quem ele estava apontando e fizesse um gargarejo delicioso e agitado. Eu cliquei, e o homem se virou quando a câmera fez barulho.

Eu sorri, checando para me certificar que a etiqueta de identidade que a Srta. Cartwright tinha me dado estava aparecendo.

“Eu estou tirando fotos para apoiar a escola,” eu disse pela enésima vez hoje. “Você gostaria que eu imprimisse elas pra você? Eu as terei prontas em torno de uma hora."

Sua suspeita evaporou, virando deleite quando eu estendi a parte de trás da câmera para ele ver.

“Eu nem ao menos sabia que você estava aí,” ele disse, sacudindo a garota. “Isso é lindo. Quanto?” Ele deslocou sua filha para alcançar seu bolso traseiro, e eu acenei para que não o fizesse.

“Estamos vendendo por um dólar, mas você paga quando as vir,” eu expliquei. “Eu as colocarei na tenda verde.” A pancada de pés rápidos veio e partiu atrás de mim, e a garotinha contorceu-se, olhando sobre o meu ombro para seguir os corredores com seus olhos.

“Estarei lá,” o homem disse enquanto lutava para segura-la. Ele olhou a infante feliz, dizendo em falseta, "A mamãe amará ter uma foto nossa." Seu amor por sua filha ainda estava em seus olhos quando ele se voltou para mim. “Obrigado. Eu sempre esqueço de trazer a minha câmera nesses negócios. Fraldas, mamadeiras, brinquedos, e seu paninho, mas nunca uma câmera.”

Assentindo, eu dei a ele um tíquete para se lembrar antes que eu acenasse para a garota arrulhada e me afastei.

Era bom estar fora fazendo algo ao invés de ficar de mal humor no meu quarto como se fosse uma prisão, saudosa dos meus antigos amigos. Ontem no Mini C com Josh fora legal, mesmo com a Amy se intrometendo e a encrenca com Kairos se aproximando. Eu tinha esquecido como era uma boa sensação ficar com alguém e não ficar com medo de ser quem eu realmente era. Hoje, o sol estava quente, o ar estava frio, e eu estava ocupada gastando o dinheiro do meu pai em tinta e papel.

Não ficava muito melhor que isso.

Das árvores próximas, eu ouvi Amy dar um grito de chamar a atenção, "Oi-i-i-i, Josh!" e eu olhei para cima para vê-lo passar correndo novamente. Parker estava lá com ele agora, e parecia que eles estavam conversando. Eu fui tirar uma foto deles, mas uma mensagem de cartão cheio apareceu.

“Cruzes,” eu disse com um suspiro, então me dirigi para a tenda onde tinha montado minha mesa. A Srta. Cartwright era realmente boazinha, nem pestanejando às pontas do meu cabelo roxo e brincos de caveira quando me dera uma mesa onde eu podia colocar algumas das fotos variadas que ninguém iria querer.

“Madison! A minha foto já está pronta?” uma voz cansada e matrona chamou, e meu olhar foi para uma mulher fatigada com três garotos poeirentos. Ela parecia pronta para encerrar. Eu tinha uma bela foto esperando dela e seus garotos no carrossel antes que eles a tivessem cansado e ficado com algodão-doce em suas roupas. O sol brilhando na pintura dourado combinava com o cabelo deles, e as linhas retas acima e abaixo contrastavam lindamente com as crinas enroladas e as pinturas brilhantes dos cavalos. Lado a lado, a semelhança familiar que tinha mudando pouco aos anos era impressionante. Eu imprimi uma segunda para mim só porque eu gostava.

“Está pronta,” eu disse, gesticulando para a tenda, mas ela estava ocupada afastando os dois mais jovens enquanto eles discutiam sobre o peixe dourado que tinham ganhado.

“Eu já vou,” ela disse rapidamente, então levantou sua voz para dizer a eles que eles iam matar o peixe se continuassem balançando-o desse jeito.

Ninguém nem ao menos notou quando eu deslizei para dentro da tenda e tracei meu caminho para a mesa de trás.

A sombra era um alívio bem-vindo, e eu relaxei atrás da longa mesa para me assentar na minha cadeira. Um som agradável escapou de mim quando eu percebi que uma boa porção das fotos tinha sumido, mesmo aquelas que eu pensara que ninguém iria querer. Feliz, eu liguei a câmera na impressora e disse para imprimir tudo. Era bom ter meus esforços apreciados.

As fotos começaram a sair uma por uma, e eu me ocupei em arranjá-las na mesa para que as pessoas pudessem achá-las. Uma sombra caiu sobre mim, e eu olhei para cima quando a Srta. Cartwright disse admiradamente, “Ah, eu ficarei com essa.”
Ela esticou a mão para a foto caindo no funil, acrescentando, “Howard é meu irmão. Eu adoraria dar isso a ele de aniversário. É maravilhoso.”

Eu espiei a foto de um homem sentado no tanque de afundamento, casualmente falando com alguém na multidão. Ele estava pingando de tão molhado, e um borrão de bola estava direcionado bem no alvo. O que aconteceria a seguir era óbvio.

“Sério?” eu perguntei, grata. “Obrigada,” eu acrescentei, entregando-a.

Ela sorriu para ela brevemente, seus olhos verdes cansados viajando carinhosamente pela foto. “Não, obrigada você. É difícil comprar coisas para ele,” ela disse enquanto colocava atrás da orelha uma mecha longa de cabelo que tinha escapado de seu grosso rabo-de-cavalo. “E essa é uma bonita do Mark,” ela disse
enquanto a foto do homem e da garotinha na pista saia. “Ele é dono do lava-carros. Ele não tem muita oportunidade de ficar com a Jóia. E assim que chamam a filha deles. Jóia.” Sua expressão se iluminou e seus dedos viajaram pelas fotos. “E a Sra. Hall. Ai meu Deus, olhe para o tamanho desse sapato. Não é de se espantar ela não ter pego sua foto. Esse casco está bem na frente e no meio.”

Eu me inquietei, envergonhada, mas era legal ouvir sobre as pessoas de quem eu tinha roubado pedacinhos da vida. Isso me fazia sentir como se eu pertencesse a algum lugar. Eu não conseguia evitar me perguntar se fora isso que eu tentara fazer hoje – capturar vidas porque a minha tinha basicamente parado e o mundo não
tinha. Continuando sem mim. Circulando como as estações.

Olhando mais perto, eu apertei os olhos, querendo levar a foto para o sol. Era quase como se eu conseguisse ver um brilho ao redor dela. Sua aura? Neeem. “Eu achei que a maneira como o roxo dos balões combinou com as solas de seus sapatos era bacana,” eu disse, tentando explicar porque as costas da Sra. Hall eram tão fascinantes. Bacana? Eu acho que é bacana? Deus! Eu sou tão nerd.

“E é.” A Srta. Cartwright sorriu para a foto da van de alguém, as portas traseiras abertas para mostrar que estava lotada até o topo com papéis não-entregues. “Você tem um talento realmente especial para composição. Para ver o que importa. O que perdemos se não diminuirmos a velocidade.”

Outra foto rolou da impressora, e eu a coloquei na mesa. “Obrigada. Eu pertenci ao clube de fotografia na minha última escola. Eu acho que aprendi mais do que pensava.”

A Srta. Cartwright fez um som interessante. “Você não está na lista da minha aula. Por que não? Você tem um bom olho para isso.”

Ela é a professora de fotografia? “Hãn, eu não sei,” eu disse, repentinamente nervosa.

As sobrancelhas da mulher se arquearam, e ela abaixou a foto da Sra. Hall. “Ah-h-h-h, você é uma dessas, não é?” ela disse, e eu encarei inexpressivamente. “Você não quer ser rotulada como cdf, então você pinta seu cabelo de roxo e evita qualquer coisa que diga que você é esperta.”

“Não,” eu disse rapidamente, mas ela fez uma cara de reconhecimento para mim, e eu mudei meu olhar para o teto empoeirado. “Clube de fotografia é quase tão ruim quanto o clube de xadrez,” eu protestei, e ela riu, pegando a próxima foto enquanto saia. Eu tinha um pressentimento de que o clube de fotografia não tinha ajudado na minha busca por popularidade na minha antiga escola.

Eu não achei que fosse me ajudar muito aqui, tampouco. Mas por que é que ainda estava tentando entrar no grupo dos populares?

“Reconsidere isso, Madison,” ela disse enquanto examinava a foto. “Há muito talento aqui. Eu estive olhando o que você esteve fazendo, e você está capturando vida de um jeito que é unicamente bonito; mesmo a feiúra é bonita. Esse tipo de olhar é difícil de ser revelado, com o perdão do trocadilho. Você talvez consiga uma bolsa de estudos se se aplicar.”

Eu estava morta, sim, mas eu provavelmente ainda tinha que ir à escola e conseguir um bom emprego. Se eu ia viver para sempre, eu preferia faze-lo em uma bela casa do que num beco. “Você acha?” eu perguntei a ela, ponderando se eu conseguia ganhar dinheiro fazendo algo que eu amava. Quase não parecia justo.

A Srta. Cartwright abaixou a foto quando outra mulher começou a olhar as fotos.

Reconhecendo-a, eu apontei as suas. Seu ooh de deleite me fez sorrir, e ela se demorou antes de pagar por elas, rindo das fotos de seus vizinhos.

“Eu falarei com o conselheiro e te colocarei na minha aula avançada,” a Srta. Cartwright disse para conseguir minha atenção de volta. “Você vai ser uma veterana esse ano, certo?”

Um tremor correu por mim. Veterana. Eu gostava do som disso. “Está bem,” eu disse. “Você me convenceu.” Eu estava mais feliz sendo eu mesma – cabelo roxo, música alta, morta, e tudo – do que quando estava tentando me encaixar com as Amys. E eu não achava que Josh fosse me descartar só porque eu não estava
no grupo dos populares. Não que nós realmente fossemos alguma coisa.

Ela assentiu, deslizando para pegar a foto de Josh, Uma das primeiras a serem impressas.

“Outra do Josh?” ela disse, sorrindo. “Uau, você tirou uma boa aqui. Você tirou essa da arquibancada?” Eu assenti, e ela murmurou, “Mão firme. Que pena o brilho do sol nessa foto. Engraçado. Ele geralmente não aparece quando o sol está nesse ângulo.”

Ela franziu a testa, levando a foto até seu nariz. “Algo nessa me deixa desconfortável. O espremer dos olhos, talvez...” Seus ombros levantaram e cairam. “Pode ser os corvos nos fundos. Minha avó os perseguia para saírem de seu telhado o tempo todo. Ela odiava corvos."

Meu rosto endureceu. Corvos?

A Srta. Cartwright abaixou a foto. “Você foi ótima hoje, Madison,” ela disse com um sorriso. “As pessoas estão dando mais do que a doação pedida. Você conseguiu mais que duzentos dólares.”

Não houvera corvos na pista - houvera? Grace estivera bem ali com o Josh. Eu a tinha visto.

“Melhor que o tanque de mergulho, a Srta. Cartwright dizia. “Howard ficará decepcionado. Ele é geralmente a grande atração. Por que você não encerra o dia?” ela sugeriu. “Vá se divertir. Eles estão prestes a ler o total. Você devia encontrar o Josh e ficar para a festa. Vai ter dança…”

Ela me deu um sorriso final e foi puxada por uma mulher nervosa segurando um punhado de tíquetes. Eu mal notei a sua partida, e eu peguei a última foto que tinha tirado de Josh.

Não eram corvos nos fundos, eram asas negras. Elas estavam à distância sobre a linha das árvores, mas era isso que eram.

Frenética, eu olhei por baixo da tenda para procurar a linha que as árvores faziam com o céu.

Nada. Eu só conseguia ver uma pequena fatia do céu. Algo devia estar errado. Grace devia estar observando-o, mas havia asas negras, e onde havia asas negras, havia ceifadores. Ou Kairos. Se ele estivesse aqui, eu nunca saberia. O trabalho da Grace era proteger o Josh, não me dizer quando havia encrenca.

Numa explosão de movimento, eu desconectei minha câmera da impressora. As fotos já estavam na fila, e após me certificar de que havia papel o bastante no funil, eu deslizei por baixo das cordas nos fundos da tenda. Eu tinha que achar o Josh.

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