O ar no curso superior do rio estava frigidamente frio, e meu cabelo molhado parecia congelado quando Barnabas nos deixou onde tínhamos começado essa manhã: no estacionamento da Escola New Covington.
Como sempre, suas asas tinham desaparecido em um redemoinho de vento antes de eu poder dar uma boa olhada nelas, substituídas por uma calça jeans seca, uma camiseta preta normal, e um casaco comprido totalmente inadequado para o clima quente, mas totalmente apropriado para fazê-lo parecer bonito. A cor suave me lembrava suas asas enquanto guarnecia seus ombros e caía sobre seus calcanhares.
Incerta, eu me contorci entre alguns carros para chegar ao bicicletário. Os veículos não tinham estado aqui essa manhã, e eu me perguntei o que estava acontecendo.
Levei duas tentativas para acertar a combinação, e eu lentamente pedalei minha bicicleta verde de dez marchas de volta para a sombra e Barnabas, sustentando-a
contra a parede da altura da cintura entre a encosta íngreme e a estrada principal e antes de desmoronar contra ela para esperar Ron, o chefe de Barnabas.
Eu sentia falta do meu carro, ainda na Flórida com a minha mãe, mas a falta de um veículo tinha sido mais do que compensada pela chance de conhecer meu pai novamente. Mamãe tinha me mandado para cá porque ela estava de saco cheio de conversas com os professores/diretores/pais e se preocupava quando o telefone
tocava depois de escurecer que pudesse ser a polícia. Tudo bem, então talvez eu tivesse ficado um pouco entusiasmada em "exercer minhas tendências de pensamento livre," como o conselheiro da escola tinha dito a minha mãe, logo antes dele ter me dito em privacidade para parar de tentar ganhar atenção e crescer, mas
tinha sido tudo coisas inocentes.
Uma cigarra lamentou de algum lugar, e eu me mexi na parede ao lado de Barnabas e cruzei meus braços sobre meu peito. Imediatamente eu os abaixei, não querendo parecer pensativa. Barnabas parecia pensativo o bastante por nós dois. Seu aperto em mim no vôo de volta tinha sido desconfortável. Ele tinha estado quieto demais.
Não que ele falasse muito, mas havia uma dureza agora, quase um ressentimento.
Talvez ele estivesse chateado por ter ficado molhado ao pular no lago. A minha bunda toda estava úmida agora, graças a ele.
Desconfortável, eu fingi arrumar meus cadarços para que eu pudesse me deslocar uns dois centímetros dele.
Eu podia ter pedido a ele para me deixar em casa, mas minha bicicleta estava aqui. Para não mencionar que eu não queria que a enxerida da Sra. Walsh visse o Barnabas crescer suas asas e voar para longe. Eu juro, a mulher tinha binóculos no peitoril de sua janela. A escola fora o único lugar que eu pensei que ninguém me
veria. Por que havia carros aqui agora eu não fazia ideia.
Eu tirei meu telefone do meu bolso, liguei ele, chequei minhas chamadas perdidas, e o guardei. Olhando para Barnabas, eu disse, “Sinto muito eu ter sido identificada na sua colheita.”
“Não era uma colheita. Era a prevenção de uma gadanhada.”
Sua voz estava apertada, e eu pensei que para alguém que esteve por aí há tanto tempo, ele certamente conseguia agir infantil. Talvez fosse por isso que ele era designado aos de dezessete anos.
“Eu ainda sinto muito,” eu disse enquanto procurava defeitos no alto da parede de cimento.
Inclinando-se contra a parede, Barnabas forçou seu olhar torto no céu e suspirou.
“Não se preocupe com isso.”
Eu tamborilei minhas unhas no cimento duro enquanto novamente o silêncio descendia. “É lógico que a bonita seria a ceifadora negra.”
Barnabas levou seu olhar de volta a mim, afrontado. “Bonita? Nakita é uma ceifadora negra.”
Meus ombros subiram e desceram em uma contração. “Vocês são todos lindos. Eu poderia escolher um de vocês em uma multidão simplesmente por isso.” Seu rosto mostrou surpresa – como se ele nunca tivesse notado como todos eram perfeitos. Quando ele desviou o olhar, eu acrescentei, “Você a conhece?”
“Eu a ouvi cantar antes, sim,” ele disse suavemente. “Então quando ela usou seu amuleto para fazer sua gadanha, eu consegui juntar o nome ao rosto. Ela tem sido uma ceifadora negra por um longo tempo para ter a pedra de um violento tão profundo. Eles lentamente mudam de cor com a experiência, os ceifadores brancos passam pelo espectro de verde, para amarelo, para laranja, e finalmente um vermelho tão profundo que é quase preto. Os ceifadores negros vão na direção contrária, pelos azuis e roxos até o violeta. A cor da sua pedra reflete-se na sua aura quando você usa seu amuleto. Mas você não consegue ver auras ainda, consegue?”
Isso tinha sido claramente traiçoeiro, e se eu não estivesse pensando na minha própria pedra, preta como o espaço, eu teria lhe dito para calar a boca.
“Então ela faz isso há mais tempo que você,” eu disse, e ele virou-se para mim com espanto.
“Como você descobriu isso?” ele perguntou, soando insultado.
Eu olhei para seu amuleto, um preto absoluto agora que ele não o estava usando. “É como o arco-íris. Ela é violeta, e você é laranja, um passo do vermelho, bem do outro lado do arco-íris. Você não é vermelho ainda. Se você ficar vermelho, você será tão experiente quanto ela.”
Ele olhou-me de cima a baixo, sua postura ficando dura. “Meu amuleto não é laranja. É vermelho!”
“Não, não é.”
“É sim! É desde as pirâmides.”
Eu acenei uma mão em desinteresse. “Que seja... eu ainda não entendo como ouvi-la cantar tem a ver com isso.”
Com uma bufada de raiva, ele virou-se para o estacionamento e para longe de mim.
“Amuletos tornam possível se comunicar além da esfera da terra, e eu a ouvi. A cor de sua pedra e o som de sua cantoria combinavam. Meio como eu escutar uma aura ao invés de vê-la. Dali, não é difícil adivinhar quem está cantando porque existem tão poucos de nós dentro da esfera da terra para começo de conversa. E apesar de
eu poder ouvir ceifadores negros, eu não consigo distinguir o que eles estão dizendo. Nakita teria que mudar a cor de seus pensamentos para combinar com a minha aura para isso, e estamos tão distantes no espectro que isso seria quase impossível. Além do mais, por que eu iria querer os pensamentos dela nos meus?”
Minhas sobrancelhas levantaram. Aquele pedacinho de informação podia ser útil visto que eu passei a porcaria dos últimos quatro meses tentando aprender a usar meu amuleto. “Hm. Eu achei que você só... aparecia do céu ou algo assim quando queria conversar.”
A cabeça dele caiu. “Fazem eons desde que eu peguei um amuleto e me tornei terrestre."
Ele é terrestre? “Uau,” eu disse, cascalho sendo pulverizado debaixo dos meus sapatos enquanto eu me deslocava para encará-lo. “Ceifadores são terrestres?”
“Não, só os ceifadores brancos são terrestres,” ele disse, corando pelo que parecia ser embaraço. “Nakita é livre para ir e vir. Ela toca a terra tempo o bastante para matar; então ela se vai.”
Isso soava meio amargo. “Eu achava que todos os anjos viviam no céu.”
“Não,” ele disse curtamente. “Nem todos nós.”
Fazendo careta, ele correu uma mão pelo seu cabelo frisado, deixando-o ainda mais bagunçado, em um jeito charmosamente atraente. “Poucos anjos transgridem, mas aqueles que o fazem tomam o caminho dos ceifadores para compensarem. E quando se absolvem, eles retornam para seus trabalhos.”
Compensar? Absolvição? Barnabas era um ceifador porque tinha se metido em encrenca? E aqui estava eu, metendo-o em mais. Eu suponho que salvar vidas ficasse bem no currículo de um anjo. “O que você fez?” Eu perguntei.
Barnabas cruzou seus braços e se inclinou contra a parede. “Eu sou um ceifador branco por causa do juízo de responsabilidade moral, não porque eu desagradei os serafins. Eu não ligo para o que eles pensam.”
Eu tinha ouvido Barnabas jurar pelos – ou xingar os – serafins antes quando tínhamos sentado no meu telhado e arremessado pedras nos morcegos. Eu sabia muito bem que ele não pensava muito bem dos altos riquinhos do reino dos anjos, mas eu não podia evitar me perguntar o que os serafins tinham feito. Acho que era preciso muito esforço para comandar um universo.
Ainda não olhando para mim, Barnabas saiu da parede e se moveu para ficar parado na beirada da luz. Ele não estava me contando algo, um sentimento que cresceu quando ele colocou suas mãos em seus quadris e encarou o quente estacionamento. “Ela está certa, contudo. Algo cheira pior que asas negras no sol,” ele disse, quase para si mesmo. “Nakita disse que você tem a pedra de Kairos. Isso não é possível. Ele é...”
Barnabas se virou, me fazendo estremecer com sua expressão. “Madison, estava pensando. Quando Ron vier, eu vou pedir a ele para que outra pessoa lhe dê instruções."
Meus lábios se separaram, e eu senti que estava sendo socada no estômago. De repente fazia muito mais sentido. Ele está desistindo de mim. Deus, eu devo ser mais estúpida do que achava. Magoada e não sabendo o que mais fazer, eu deslizei da parede, raspando as costas das minhas pernas quando não me empurrei distante o bastante. Lágrimas pinicaram os meus olhos, e, agarrando minha bicicleta, eu fui para a entrada distante. Eu ia para casa. Ron podia me achar lá.
“Onde você está indo?” Barnabas disse enquanto eu jogava minha perna por cima da minha bicicleta.
“Para casa.” Estar morta era uma droga. Eu não podia contar para ninguém, e agora eu ia ser passada como uma cesta de frutas de Natal que ninguém queria. Se Barnabas não me queria ao redor, tudo bem por mim. Mas ficar aqui enquanto ele contava ao Ron era humilhante.
“Madison, não é que você esteja me desapontando. Eu não posso ensiná-la,” Barnabas disse, seus olhos castanhos tanto preocupados quanto simpáticos.
“Porque eu estou morta e sou estúpida. Entendi essa parte,” eu disse miseravelmente.
“Você não é estúpida. Eu não posso ensiná-la por causa do amuleto que você tem.”
Suas palavras continham uma quantidade assustadora de preocupação, e eu parei, repentinamente assustada.
Todo esse tempo, Ron nunca fora capaz de saber que tipo de amuleto eu tinha pego. “O amuleto do Kairos?” Eu sussurrei, então me endureci por causa do formigamento repentino entre minhas omoplatas. Eu congelei, meu olhar vagando para as sombras, me perguntando se elas não tinham pulado para frente. O olhar de
Barnabas foi atrás de mim, e sua expressão virou uma mistura estranha de alívio e cautela.
“Eu só tenho um momento. Vamos ver os seus amuletos,” veio a voz distintamente rápida do timekeeper*.
* eu tinha traduzido esse termo antes como 'juiz' lá no glossário, mas percebi que acaba perdendo bastante do sentido original desse jeito. A descrição continua a mesma, ou seja, um timekeeper é alguém que tem um poder sobre o tempo, controlando, parando ele, e pode ser tanto usado para o bem quanto para o mal.
Eu girei para ver um pequeno homem estreitando os olhos para o sol. “Ron,” eu disse suavemente enquanto ele marchava para frente, seu robe frouxo cinza tão ruim quanto o casaco comprido de Barnabas no quesito de ser totalmente errado para o calor. Eu olhei para a escola, esperando que ninguém me visse com eles. Eu
já tinha uma reputação ruim o bastante de ser estranha. Seis meses, e eu ainda era a novata. Talvez eu devesse começar a me censurar. Ninguém mais tinha cabelo roxo.
Chronos – apelidado de Ron – parecia uma cruza entre um bruxo e Gandhi, com um pouco de artes marciais – com um robe e olhos castanhos que me davam a impressão de que ele podia ver pelos cantos. Suas sobrancelhas eram loiras do sol, mas sua pele e seu cabelo encaracolado eram escuros. Mais baixo do que eu, ele mesmo assim tinha uma enorme presença. Podia ser a sua voz, que era mais profunda do que alguém esperaria. Ele tinha um sotaque agradável e rápido, como se tivesse muito a dizer e não muito tempo para dizê-lo.
Ele se movia rapidamente, também, e tinha um amuleto que o permitia mobilizar o, fluxo de tempo e o impedia de envelhecer, já que, ao contrário dos ceifadores, os timekeepers eram humanos por algum motivo.
O que provocava a pergunta de quantos anos ele tinha. Ele usava sua habilidade para manipular e ler o tempo para ajudar os ceifadores brancos. Foi através dele que Barnabas adquiria suas tarefas de prevenção de gadanha.
Olhando amargamente para o céu, Ron levantou sua mão, os dedos balançando.
“Madison?”
“Ron, sobre o meu amuleto,” eu comecei, segurando-o perante o timekeeper, ainda em sua passadeira de couro ao redor do meu pescoço.
“Sim, eu sei. Eu vou consertar isso,” ele murmurou enquanto seus dedos se embaçavam e desapareciam por um momento, circulando meu amuleto. Eu senti um formigamento pelo meu escalpo, e então se foi.
“Quando você pintou seu cabelo?” ele disse levemente, seu olhar aguçado não encontrando o meu.
“Depois do baile. Ron—”
Mas ele já estava parado perante o ceifador branco, sua mão aberta de um modo possessivo. Barnabas parecia claramente enjoado enquanto ele se elevava sobre o pequeno homem. “Barnabas...” o homem entoou com aviso, ou talvez recriminação.
Eu acho que o Barnabas ouviu também, já que ele pegou seu amuleto de seu pescoço e o deu, ao invés de chegar mais perto. Sem seu amuleto, Barnabas não podia fazer uma gadanha, perdendo muitas de suas habilidades. Sem o meu, eu seria um fantasma, mais ou menos.
“Senhor,” Barnabas disse, parecendo desconfortável enquanto seu amuleto tomava o mesmo tom que tinha tomado quando sua espada estava exposta; então voltou para um preto mate. “Sobre o amuleto da Madison...”
“Está consertado,” Ron disse espertamente enquanto retornava o do Barnabas.
Barnabas amarrou a corda simples de volta em seu pescoço e enfiou o amuleto atrás de sua camiseta. “A ceifadora negra na gadanhada reconheceu.”
“Eu sei! É por isso que estou aqui! Você foi identificado,” Ron latiu, os punhos em seus quadris enquanto ele olhava para ele, e eu abaixei meus olhos, desgostada.
“Os dois. Na primeira prevenção de gadanha dela. O que aconteceu?”
Ótimo, eu tinha metido Barnabas em encrenca novamente. “Sinto muito,” eu disse com pesar, e a cabeça de Barnabas levantou. “Foi tudo ideia minha,” eu disse com emoção, pensando que eu levasse a culpa, Barnabas talvez me desse outra chance. Meu conhecimento de que auras tinham som talvez fizesse toda a diferença na nossa prática, e talvez então fôssemos capazes de completar o toque de pensamento. “Barnabas não quer ficar comigo até que possamos tocar pensamentos, mas eu convenci ele que não grande coisa. E então eu conheci a Susan. Eu não pude deixar aquela ceifadora matá-la. Aconteceu tão rápido.”
“Pare!” Ron latiu, e eu pulei. Os olhos do homem estavam arregalados, e ele estava encarando Barnabas, que estava... contraindo-se?
“Você me disse que ela conseguia tocar pensamentos!” o homem pequeno acusou, e minha boca caiu aberta. “Você mentiu? Um dos meus próprios ceifadores mentiu para mim?”
“Ah,” Barnabas gaguejou, recuando quando Ron deu um passo para frente para encará-lo. “Eu não menti!” ele gritou. “Você assumiu que ela conseguia tocar pensamentos quando eu disse que ela estava pronta. E ela está.”
Ele acha que eu estou pronta? Mesmo quando não podemos tocar pensamentos?
Os olhos de Ron se estreitaram. “Você sabia que eu não permitiria que ela fosse a uma prevenção até que ela pudesse tocar pensamentos. Por causa disso, cinco memórias tiveram que ser mudadas. Cinco!”
Minha breve euforia de que Barnabas pensasse que eu estava pronta evaporou, e eu desejei que tivesse mantido minha boca calada. Presentes de cachorrinhos no tapete, isso era uma porcaria.
“Não importa o quanto pratiquemos, Madison não será capaz de tocar pensamentos comigo,” Barnabas protestou, seu rosto ficando vermelho. “É o amuleto dela, não ela!”
“Bom Deus todo-poderoso,” Ron interrompeu, virando-se com uma mão no ar. “Eu não posso manter isso afastado dos serafins. Pode imaginar o fervor? Você simplesmente não passou tempo o bastante com ela. Aprender como tocar pensamentos é feito vagarosamente, nada de bang e é já é capaz de fazê-lo."
As sobrancelhas de Barnabas se enrugaram. “Eu nunca disse que ela não seria capaz de aprender a tocar pensamento com alguém, só não comigo. Senhor,” ele disse, olhando para mim, “Nakita era a ceifadora negra designada para a gadanha. Ela reconheceu a pedra de Madison. Madison tem o amuleto de Kairos!”
O timekeeper ficou parado em choque. Alarme virou uma surpresa de arregalar os olhos. Vendo seu olhar tocar meu amuleto, eu coloquei meu punho ao redor da pedra tão firmemente que os fios prata afundavam um pouco profundamente. Era meu. Eu tinha clamado ele e ninguém iria pegá-lo sem uma briga. Nem mesmo Kairos, quem quer que ele fosse.
“Kairos?” Ron sussurrou, e então, vendo meu medo, ele quebrou o contato visual comigo.
“Sim, e se ela tem o amuleto do Kairos,” Barnabas disse, “então talvez–”
“Silêncio,” Ron sussurrou, cortando suas palavras, e Barnabas fumegou. “Eu sabia que não era uma pedra de ceifador normal, mas do Kairos? Tem certeza de que foi isso que a Nakita disse?”
Barnabas estava de pé duramente. “Eu estava lá, senhor.”
Nakita também disse que eu pertencia a eles, o que me faz sentir super feliz. Eu só queria ser quem eu era antes, alegremente ignorante sobre ceifadores e timekeepers e asas negras. Talvez se eu os ignorasse, eles sumiriam.
Ron deu uma olhada em nós, sua postura dura dedurando um ar repentino de desconfiança. Ele gesticulou para a beirada da sombra. “Vá observar o céu, Barnabas.”
Silencioso, Barnabas deslocou-se para a beirada do sol e mandou seu olhar para cima. Um tremor passou por mim. Tudo tinha mudado em um instante – por causa de Kairos.
“Quem é Kairos?” Eu perguntei, virando minha atenção de volta para Ron.
“Meu equivalente.” Ron tinha suas mãos em seus quadris enquanto olhava desconfortavelmente do abrigo da árvore para o quente estacionamento. “Ceifadores brancos, ceifadores negros. Timekeeper branco, timekeeper negro. Você não achou que eu fosse o único, achou? Tudo tem um equilíbrio, e Kairos é o meu. Kairos observa os fios do tempo se trançarem em futuros possíveis e manda ceifadores negros para gadanhar as pessoas mais cedo. Eu passo mais tempo tentando prever o que ele fará do que qualquer outra coisa.”
Ele disse a última palavra como se fosse uma maldição. Meu coração estava golpeando novamente, e eu cruzei meus braços sobre meu peito como se pudesse fazer parar. Está bem. Eu tinha pego o amuleto de um timekeeper. Porcaria, eu tinha que me livrar dessa coisa, mas não era como se eu pudesse emprestar o amuleto de um ceifador e devolver esse pro Kairos. Mantê-lo era minha única opção. Eu nunca dormiria novamente. Ainda bem que eu não precisava.
“Não é de se espantar que Seth não retornou,” eu disse, tentando chegar a uma conclusão. “Aposto que ele está se escondendo do Kairos.”
Franzindo a testa, Ron se moveu mais profundamente para a sombra para se inclinar contra a parede ao meu lado. “Um ceifador não seria capaz de usar o amuleto de Kairos, bem como um timekeeper não pode usar o de um ceifador,” ele disse. “Nakita deve estar enganada. A não ser que–” as sobrancelhas de Ron levantaram em um pensamento privado enquanto ele se virava de lado para olhar para mim – “não foi um ceifador que te matou. Talvez Kairos estivesse fazendo um pouco de gadanha extracurricular própria.”
Barnabas olhou sobre seu ombro por isso, e Ron acenou para que ele ficasse quieto. Novamente.
“Como Seth era?” Ron perguntou, sua voz enganosamente branda.
Nervosa, eu me levantei para sentar na parede, olhando para Barnabas, mas ele tinha voltado seu olhar para o céu. Eu levei meus joelhos para o meu queixo, não querendo lembrar aquela noite, mas a lembrança voltou com uma claridade cristalina. “Tez escura,” eu disse. “Cabelo ondulado escuro. Um belo sotaque.” Ótimo
beijador, eu acrescentei em meus pensamentos, recuando. Ah, Deus. Eu tinha beijado o cara que tinha me matado.
O estranho sexy no baile tinha virado Seth, o psicopata, um ceifador negro empenhado em me matar. O que ele fez, usando uma lâmina de ceifador depois de que rolar o seu conversível barranco abaixo não o tinha feito. Eu tinha acordado no necrotério naquela noite para ouvir Barnabas discutindo com outra ceifadora branca sobre de quem era a culpa por eu estar morta. Eles tinham estado lá para se desculpar e manter as asas negras afastadas da minha alma até eu chegar a minha “recompensa.” Mas tudo mudou quando Seth apareceu no necrotério também.
Parecia que ele queria jogar minha alma na frente de alguém para ”comprar seu caminho para uma corte superior,” o que quer que isso significasse. Mas só Barnabas e eu sabíamos essa última parte. Por alguma razão Barnabas pensou que não devíamos dizer nada sobre isso ao Ron. E então eu roubei o amuleto do Seth, e o fato de que fui capaz de fazer isso e permanecer aqui era um mistério para todos envolvidos.
Ron esfregou sua orelha como se tivesse um tique nervoso. “Mais alto que você cerca de um palmo?”
Meu estômago apertou. “É,” eu murmurei, “é ele.”
O pé de Barnabas se deslocou na brita enquanto um longo exalar escapava de Ron.
“Macacos me mordam!” Ron murmurou, então começou a marchar entre os confins da sombra. “Foi Kairos,” ele disse firmemente. “Ele não te deu seu nome verdadeiro. Deus, se você já me amou, abra seus olhos para mim quando eu estiver sendo tão estúpido assim!"
“Mas ele parecia ter a minha idade,” eu protestei. Ótimo, não só eu tinha beijado o cara que tinha me matado, mas ele era mais velho que as pirâmides também. Eca!
Agora que eu pensava nisso, ele era bom demais tanto em dançar quanto em beijar para ter dezessete anos.
“Kairos ganhou sua posição extraordinariamente cedo, muito antes que seu predecessor quisesse.” Repensando, Ron encarou o estacionamento. “Não envelheceu um dia desde que adquiriu o amuleto que agora circula seu pescoço. Muito prima dona. Eu aposto que ele não está feliz por estar envelhecendo novamente. Eu aposto que o amuleto de um timekeeper é a única pedra divina que você poderia clamar que não transformaria a sua alma em pó.”
“Porque eu estou morta?” Eu adivinhei, e Ron balançou sua cabeça.
“Porque você é humana. Bem como os timekeepers são.”
“Então não foi realmente minha culpa que eu não pude mantê-la viva,” Barnabas interrompeu. “Eu não posso ganhar de um timekeeper.”
“Não, não pode,” Ron disse, mandando-lhe um olhar que dizia para calar a boca. “E se a Madison se ligou ao amuleto do Kairos, o único jeito dele poder recuperá-lo é se ela estiver morta.”
“Mas eu estou morta,” eu protestei, as mãos agarradas nos meus joelhos puxados.
Ron sorriu fracamente. “Quero dizer, sua alma está destruída. Ele tem o seu corpo, eu presumo. Alguém o tem. E enquanto você existir de alguma forma, o amuleto está ligado a você. Que você foi simplesmente capaz de tirá-lo dele já é um milagre.” Ele olhou para Barnabas quando o ceifador tentou interromper. “Você precisa ficar longe dele,” ele disse, voltando-se para mim.
“Sem problema,” eu disse, escaneando o céu para que eu pudesse ver. “Só me diga em que nuvem ele vive, e eu anotarei.”
Ron continuou a marchar, seu robe movendo-se elegantemente e sua forma frágil permanecendo na sombra da árvore. “Ele vive na terra, assim como eu,” ele disse afastadamente, claramente preocupado demais com seus pensamentos para entender a piada.
“Senhor,” Barnabas disse, me deixando nervosa quando virou suas costas para o céu. Alguém não devia ficar observando? “Se Kairos não veio atrás dela até agora, talvez ele não venha.”
“Kairos desistir de sua busca por imortalidade? Não. Eu duvido,” ele disse. “Eu acho que ele não veio atrás da Madison ainda porque até hoje ninguém sabia que ele tinha perdido seu amuleto. Ele indubitavelmente estava tentando fazer outro. Quanto mais ele passa fazendo-o, melhor ficará – apesar de que ele nunca criará um que seja compatível ao poder que o que ele perdeu. Não, Nakita provavelmente lhe contou que Madison está com ele. Ele estará procurando por ela agora. Nós teremos que esperar que eu tenha mudado a sua ressonância rápido o bastante."
“Timekeepers fazem amuletos?” Eu perguntei, surpresa, e minha atenção caiu no próprio amuleto preto de Ron, quase perdido nas dobras de seu robe. “Você não pode me fazer um novo e eu darei ao Kairos seu amuleto de volta?”
Ron pestanejou para mim como se tivesse sido assustado pelo pensamento. “Eu os faço, sim, e eu os dou aos anjos que devem entrar em ação e escolher se tornar algo que nunca foram antes. Nem todos estão felizes com o jeito que as coisas são, e essa é uma das muitas maneiras de fazer a diferença. Mas você está morta, Madison. Eu não posso criar uma preta para manter os mortos vivos. Tentar usar uma que eu dei a um ceifador irá queimar a sua mente humana. Para mim, já que Kairos te matou, você tem o direito de manter o dele. É claro, os serafins podem achar diferente.”
Eu mordi meu lábio inferior quando Barnabas deslocou sua atenção para a estrada no alto da colina enquanto um carro passava. Serafins. Eles tinham o respaldo de tomar grandes decisões. Ceifadores estavam abaixo deles, e anjos da guarda mais ainda. Barnabas falava de serafins como se fossem crianças mimadas com poder. Assustador. “Isso é ruim, não é?” Eu expressei suavemente.
O latido de risada de Ron morreu rapidamente. “Não é bom,” ele disse; então, vendo minha testa espremida, ele sorriu. “Madison, você reivindicou a pedra do Kairos. É sua. Eu farei meu melhor para fazer com que permaneça desse jeito. Só me dê tempo para fazer a máquina política funcionar.”
Eu deslizei da parede, a coragem exigindo que eu me movesse. “Ron, eu sei porque ele está atrás de mim agora, mas isso começou há meses. O que eu fiz para fazê-lo vir atrás de mim em primeiro lugar?”
Barnabas virou-se da beirada da sombra para nos encarar, mas Ron o interrompeu antes que ele pudesse falar, vindo para frente para tomar minhas mãos e sorrir tranquilizadoramente. Pelo menos eu acho que era para ser tranquilizador. Mas havia algo nos fundos de seus olhos que me deixava enjoada.
“Eu tenho algumas ideias,” ele disse, seu olhar tocando o meu brevemente antes de se desviar. “Vamos descobrir mais. Não há necessidade de preocupá-la sem necessidade."
“Ron, se ela tem a pedra de Kairos, então talvez–”
“Ah, olha a hora,” Ron proferiu impulsivamente, pegando o braço de Barnabas e realmente tirando o equilíbrio do ceifador. “Temos que ir.”
Ir? Ir aonde? Assustada, eu dei um passo para frente. “Você está indo embora?”
“Voltaremos em breve.” Ron deu uma olhada enquanto arrastava Barnabas o lugar ensolarado. “Tenho que falar com os serafins, e eu precisarei de Barnabas intermediário.” Ele sorriu, mas pareceu tenso. “Eu não estou morto ainda, sabe,” ele disse com um bom humor forçado. “Eu não tenho uma linha direta com o plano divino. Não precisa se preocupar, Madison. Tudo está bem.”
Mas não parecia bem. As coisas estavam acontecendo rápido demais, e eu não gostava disso.
“Senhor!” Barnabas exclamou enquanto se livrava do aperto de Ron. “Se Kairos vier atrás dela, mudar a ressonância de seu amuleto não será o bastante. Ele sabe como ela é. Assim como Nakita. Qualquer um dos dois pode simplesmente andar por aí e achá-la. Não deveríamos deixá-la com um anjo da guarda?"
Ron pestanejou como se estivesse chocado por não ter pensado nisso sozinho. “Ah, é claro,” ele disse enquanto voltava para a sombra. “Que coisa perfeitamente apropriada para fazer. Mas, Madison,” ele disse enquanto agarrava sua pedra e um brilho de luz preta vazava entre seus dedos, “Eu aconselharia você a não dizer nada sobre o amuleto de Kairos para seu anjo.” Seus olhos foram para meu amuleto e então de volta para o meu olhar. “Quanto menos souberem que você o tem, menos eu terei de convencer que você deve mantê-lo.”
Apavorada, eu acenei, e ele sorriu. Quase antes da minha cabeça parar de mover, uma esfera fraca de luz dourada enevoou-se na forma da árvore de carvalho. Eu encarei o brilho dançante e pairante. Tinha de ser um anjo da guarda. Para mim? Barnabas estava claramente aliviado, e eu me perguntei por que ele ligava quando estivera tão ávido em se livrar de mim nem vinte minutos atrás.
A bola de luz encolheu até nada onde pousou acima da parede, e eu encarei quando uma voz etérea pareceu se inserir na minha cabeça, dizendo, " Guardiã, Requerida de Anjo à Ceifadora, Extinção por Segurança, como requisitado."
Batendo no meu ombro, Ron se virou, aparentemente tendo ouvido também. “E você é?”
"G.R.A.C.E.S. um-setenta-e-seis," o sino curioso veio de novo, fazendo meus ouvidos zumbirem.
Anjo*? Tipo um bebê nu voando com flechas?
* o termo usado no anagrama original é 'cherubs', ou 'querubins', mas para que ficasse adequado, eu traduzi como 'anjo'. É uma das 'categorias' dos anjos, e vem logo abaixo dos serafins na hierarquia celestial.
Barnabas pareceu preocupado e a bola de luz reapareceu enquanto a voz agressivamente disparou, “Tem um problema com anjos, ceifador?”
“Não,” Barnabas disse. “Eu não achava que a G.R.A.C.E.S. empregava a união de anjos até que o protegido tivesse dezoito.”
Um pequenino bufo rude encheu a minha mente. “Como se alguém fosse se apaixonar por ela.” a luz zombou. “Eu sou um anjo. Não uma milagreira.”
“Ei!” Eu exclamei, insultada, e o globo de luz se virou para mim. Eu recuei quando ele chegou perto demais.
Graces*, hein? Está mais para um vagalume do inferno.
* Graças, em inglês.
“Pode me ver e me ouvir?” a bola da luz se intrometeu enquanto corria em um pequeno círculo ao meu redor, e eu girei para tentar mantê-la em vista.
“Ouvir, sim. Ver? Na verdade, não.” Desorientada, eu parei de me virar, e o brilho parou na barra da minha bicicleta e se dissipou. Barnabas fungou, e o brilho reapareceu e apagou.
“Deleitável,” Ron disse lentamente. “Um-setenta-e-seis, esse é um trabalho temporário, não até que a morte as separe. Mantenha-a segura, e eu quero saber imediatamente se algo ofensivo chegar a trinta cúbitos dela.”
A luz mudou da bicicleta e deslocou-se para mim. “Trinta cúbitos. A-a-a-afirmativo!”
Afirmativo? Isso é um anjo, certo?
Ron me deu um último olhar de aviso para me comportar, agarrou o braço de
Barnabas, e começou a levá-lo para longe. “Eu voltarei quando puder. Ah, e eu gostei do seu cabelo. É bem... você.”
Eu tentei alisar a minha testa enquanto eu manuseava as pontas do meu cabelo, então me sobressaltei quando os dois sumiram. Minha respiração sibilou, e eu realmente vi as sombras mudarem para mais tarde no dia.
Não muito. Talvez alguns segundos, mas Ron tinha parado o tempo para cobrir suas pegadas. Minha pedra estava quente como se em reação ao seu próprio amuleto, e eu a segurei fortemente. Olhando para fora da sombra para o estacionamento claro, eu achei que o mundo parecia muito mais perigoso.
Pela primeira vez em quatro meses, eu estava sozinha.
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