segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Dez

As pessoas ao meu redor se transformaram de belas representações da vida em obstáculos irritantes, e eu me esquivei por elas tentando telefonar para Josh e escanear o céu ao mesmo tempo.

“Ainda deve estar correndo,” eu resmunguei quando não recebi resposta, e enfiei meu telefone no bolso traseiro. Eu fiz melhor progresso desse jeito, mas a saudação ocasional de algumas das mesmas pessoas das quais eu tirara fotos mais cedo reduziram a minha velocidade enquanto eu evitava tirar novas fotos.

O sol estava quente, mas estar morto tem suas vantagens, e eu não estava nem suando quando finalmente voltei para a pista. O calor tinha empurrado quase todos os observadores para a sombra mais próxima, e eu avistei Josh rapidamente. Ele estava correndo exatamente como quando eu o deixara, parecendo forte e pronto para correr mais uma ou duas voltas. Alívio abriu a minha mandíbula, mas ela se apertou novamente quando eu escaneei a linha das árvores. Asas negras. Pelo menos seis.

“Droga,” eu sussurrei, escalando uma das cercas de elo de correntes entre as arquibancadas e a pista para conseguir a atenção de Josh. As asas negras estavam distantes, mas estavam ali. Era como se estivessem confusas. Finalmente, Josh me avistou, e eu acenei freneticamente.

Imediatamente ele gesticulou para que um corredor tomasse seu lugar e diminui sua velocidade para uma caminhada.

Respirando arduamente, ele pegou a garrafa d’água que alguém tinha lhe jogado e veio na minha direção.

“Foram dezesseis voltas no total!” um homem de aparência compacta chamou, espremendo os olhos debaixo de um guarda-chuva acoplável. “Bom trabalho, Josh. Você vai ao Mini D com o resto do time de corrida? A pizza é por minha conta.”

Josh procurou a minha expressão preocupado, então dispensou-o. “Não, valeu!” ele gritou. “Tenho que ir.”

E o homem voltou para sua prancheta. Das laterais, Amy franziu a testa, observando-nos com uma mão no quadril. Ao lado dela estava uma garota loira vestida exatamente como ela.

“O que foi?” Josh disse enquanto eu abria a tranca do portão e ele passava. “Parece que você viu um fantasma.”

“Muito engraçado. Ha-ha,” eu disse, empurrando-o na direção do estacionamento. Se Kairos estava por aí, esse não era o lugar para encontrá-lo. “Olhe para isso,” eu disse, dando-lhe sua foto.

Um sorriso tomou conta de seu rosto. “Olha para o suor em mim! Essa é a Grace?”
Acima de nós veio uma risadinha, e eu olhei pra cima, para ser cegada pelo sol.

Piscando, eu tropecei na pilha de mochilas. “Dá uma olhada no horizonte,” eu sugeri enquanto a minha visão clareava, “não em como você está bonito.”

“Asas negras?” ele disse.

“Não são corvos,” eu disse, me abaixando quando a Grace pairou próxima a foto para ver.

“Não é culpa minha,” Grace disse enquanto Josh começava a enfiar coisas em sua mochila. “Eu estive com ele o dia todo,” ela protestou. “Viu, essa sou eu na fotografia. E, além do mais, elas não chegaram mais perto. Muito.”

Josh fechou o zíper de sua bolsa de ginástica e se endireitou, lançando olhares nervosos para o limite florestal e esperando asas negras. “Você sabia que elas estavam lá?” eu questionei, e o brilho da luz dela se clareou.

“Bom, sim. Elas estiveram aqui o tempo todo.” A voz tinindo de Grace soou sarcástica. “Circulando lentamente. É como se um ceifador estivesse ao redor, mas não tivesse certeza para onde está indo.”

Eu olhei para Josh, assustada e quase culpada. O que estava fazendo, me divertindo, me escondendo entre meus vizinhos como um avestruz? Eu devia estar em um beco encarando esse perverso. O fato de que Grace achava que ficar invisível era perigoso não deveria ter me impedido.

“Temos que ir,” eu disse, e após olhar para seus colegas de time, Josh assentiu.

Seu rosto estava pálido, e juntos nos dirigimos para a saída. “Grace, se você tentar nos impedir, eu juro que vou fazer você pagar.”

Ela ficou silenciosa, e a tensão traçou seu caminho até meu estômago, pioramos quando encontramos a rua principal e as pessoas lentamente andando em círculos.

Nós tínhamos que passar pelo coreto para alcançar o estacionamento, e tinha ficado lotado enquanto todos se congregavam para ouvir o total.

A banda de ensino fundamental estava tentando organizar, e com os pais acenando para conseguir a atenção das crianças e os oficiais trazendo os últimos números, passar pela multidão era impossível.

Não pode ter tanta gente assim em toda Three Rivers, eu pensei amargamente, então parei abruptadamente para evitar esbarrar em uma criança pequena quando Josh agarrou meu cotovelo. Não havia jeito de passar tão rápido. Dando-lhe um sorriso infeliz, eu diminuí a velocidade.

“Talvez as asas negras não consigam nos achar entre todo mundo,” Josh disse.

Eu assenti. “Talvez,” eu disse, lembrando-me das pessoas cujas vidas eu havia roubado hoje. Eu nunca considerei que poderia colocá-las em perigo simplesmente por andar entre elas, mas eu provavelmente tinha.

“Eu acho que Kairos está nos procurando com seus olhos, já que ele não consegue rastrear nossas auras.”

De cima, Grace disse, “Não é o Kairos, e ceifadores não caçam pessoas com seus olhos. Leva tempo demais e eles cometem erros. Vocês todos são parecidos para eles, especialmente para ceifadores negros.”

“É o Kairos, e eu não acho que ele ligue se cometer um erro,” eu protestei. “Todas as apostas estão canceladas, Grace. Ele quer seu amuleto de volta, e ele não quer que ninguém mais saiba que ele o perdeu.”

Os lábios de Josh se pressionaram, e ele se angulou para uma abertura na multidão.

“Eu só consigo ouvir metade dessa conversa,” ele reclamou. “Talvez outra pessoa vá ser gadanhada,” ele sugeriu.

“Elas estão pairando no horizonte há horas,” Grace disse enquanto rodeávamos os últimos observadores. “Já teria acontecido e as asas negras teriam ido embora.”

“A Grace diz que se fosse gadanhada normal, já teria acontecido,” eu disse para beneficio de Josh. “Eu ainda acho que é o Kairos nos procurando.”

Nós nos esquivamos de um último grupo de pessoas. Finalmente o caminho estava livre. Deixando que a banda começasse um versão entusiasta de “Louie, Louie”, nós corremos para o estacionamento, carregado com as nossas coisas. Eu relaxei um tanto quando o alcançamos com seus balões amarelos cansados pendendo varetas, marcando os cantos. Hesitando como um veado na beira da floresta, eu olhei para cima e para baixo das fileiras. Onde Josh tinha estacionado?

“Ali,” Josh disse, apontando para a sombra da árvore como se tivesse lido a minha mente, e saímos numa passada rápida, ouvindo os aplausos quando a banda parou e a voz da Srta. Cartwright saiu do alto-falante para agradecer a todos por terem vindo. Eu suspirei quando a traseira de sua caminhonete ficou visível ao redor de uma van bunduda. Mas meu alívio virou irritação quando eu notei quem estava nos esperando.

“Como eles chegaram aqui antes que nós?” eu disse. Amy estava na traseira da caminhonete, os cotovelos no alto da cabine, tentando parecer sexy com seu short de corrida. A bandagem branca ao redor de seu nariz matava o efeito. Parker estava parado na guarda traseira, deslocando-se desconfortavelmente, e Len estava inclinado contra a porta dianteira com seus braços cruzados, como se quisesse começar uma discussão.

Meus punhos curvaram-se. Eu não tinha tempo para isso.

“Serafins sumos que me mordam,” Grace resmungou. “Esse não é o meu dia.”

Da traseira da caminhonete, Amy chamou, “Oi, Madison, querida.”

Era zombeteiro, e a pele ao redor da boca de Josh estava apertada enquanto ele pescava suas chaves da sua mochila de ginástica. “Cai fora da minha caminhonete,” ele disse curtamente.

Amy abriu sua boca novamente, e eu disse repentinamente, “Oi, Amy. O que aconteceu com o seu nariz?”

Ficando rosa de vergonha, ela disse timidamente, “É uma roupa nova? Você fica tão bonitinha quanto a minha irmã caçula nessa meia-calça."

O jeito como ela dissera isso fazia parecer que eu tinha três anos, e eu espumei, pensando em talvez fazer uma centena de cópias com a foto dela com sua boca aberta para pegar mosca e seu nariz inchado e azul – e então postá-las nos corredores da escola.

Len não tinha se movido, e Josh tinha se aproximado. “Por que você não cresce?” ele disse firmemente.

Vendo a foto segurada por Josh, Len se inclinou para frente. “Deixe-me ver,” ele disse, agarrando-a, e Amy a arrebatou, por sua vez.

“Ah, não é preciosa?” ela zombou. “Quantas você tirou dele, querida?”

Meus lábios se pressionaram, mas um farfalhar suave de folhas chamou a minha atenção para ver um fantasma de asas negras passar por cima e prosseguir. De olhos arregalados, eu senti o sussurro do meu coração começar. Não aqui. Não agora!

Amy deve ter pensado que eu estava com medo dela, porque ela pulou da caminhonete e resvalou para perto.

“O time vai para o Mini D, Josh,” ela disse. “Todos estarão lá. Você vem, certo?”

O seu “você, mas não ela” implícito era óbvio, me deixando zangada. Josh pegou a foto de volta e esticou a mão para além de Len para a maçaneta da caminhonete. Ele a abriu com um puxão forte o bastante para mandar Len tropeçando para frente. “Não,” ele disse enquanto enfiava a foto no painel e empurrava sua mochila sob o assento. “Por que você não vai tomar um banho, Amy? Está suando como um porco.”

Sua boca caiu aberta, e eu abafei um riso alto o bastante para que ela ouvisse.
Len tentara fazer parecer que sua guinada brusca fora planejada, mas ele tinha perdido a compostura e sabia disso. Até mesmo sua risada não ajudou. “Vamos,” ele disse enquanto colocava suas mãos em seus bolsos e começava a recuar. “Não vou desperdiçar mais tempo aqui. Vamos. Parker?”

Amy drapejou um braço sobre os ombros de Parker para guiá-lo para longe. Ele parecia como se quisesse dizer algo, mas tudo que fez foi dar de ombros quando Josh encontrou seus olhos. Josh devolveu o dar de ombros.

Eu tentei fazer com que meu coração parasse enquanto Amy e Parker andavam entre Josh e eu, e eu forcei minhas mãos a se abrirem. Eles estavam a três carros de distância quando Amy chamou alguma outra pessoa, e eles se inclinaram para aquela direção. À distância, a banda recomeçou, alta e entusiasmada.

Josh parecia puto. Seu pescoço estava vermelho enquanto ele entrava na caminhonete e ligava o motor.

Ansiosa para estar longe, eu me virei para dar a volta por trás da caminhonete, parando abruptamente quando uma sombra ágil saiu da árvore e foi parar no meu caminho. Minha respiração sibilou. Nakita.

“Você?” Eu gaguejei, tentando realinhar meus pensamentos. Mas fazia sentido. Nakita era a única ceifadora negra que seria capaz de me reconhecer a vista – e já que ela sabia que eu tinha o amuleto de Kairos, Kairos não tinha nada a perder mandando-a atrás de mim.

“Eu te disse que era um ceifador!” Grace guinchou. “Cai fora daqui, Madison!”

Nakita deu um passo para frente, olhando a anjo. Seu sorriso aprofundou-se. “Eu acho que Ron quer que sua alma seja destruída. Ele deixou uma de primeira esfera para te observar? Ela não é capaz de me impedir.”

Eu tropecei para trás. “Josh! É uma ceifadora"! eu gritei, e escutei sua caminhonete ranger enquanto ele saia.

Com um sorriso suave e confiante, Nakita tirou seus óculos de sol e os jogou de lado. Ela usava calças largas e uma regata apertada, tudo branco. Um sino de ouro pendia dos seus quadris, e ela usava um casaco longo branco e luminescente, sua bainha arrastando na grama desbotada. A pedra preciosa em sua lâmina retirada
brilhava uma matiz rica e violeta, combinando com o amuleto em torno de seu pescoço. A Morte estava andando – procurando por mim.

“Olá, Madison,” ela disse, me nomeando enquanto jogava seu longo cabelo preto para trás. “Você é uma alma difícil de se encontrar.”

Eu recuei, agarrando minha câmera como se pudesse me ajudar. Porcaria, onde estava o Barnabas quando eu precisava dele? Eu não podia reivindicar o amuleto de Nakita porque ela era uma ceifadora – como eu iria fazer isso? Eu tinha que bolar um jeito de tirá-lo dela. Mas como? Eu tinha que fazer isso rápido.

Josh estava de repente ao meu lado, parecendo assustado, mas determinado. Grace pairava sobre nós. Eu ouvi um farfalhar da árvore – asas negras. “Faça!” Josh sussurrou intensamente.

Eu podia muito bem tentar e ver o que acontecia. Se eu não fizesse isso, Josh estava morto. Eu não tinha nada a perder. Dando-lhe minha câmera, eu tomei um longo fôlego para trazer a imagem mental do meu amuleto à minha mente e retirei cada linha que eu conseguia ver que estava me conectando ao presente. Eu
cambaleei, quase caindo por causa da sensação tonteante de ficar insubstancial.

Grace ficou abruptamente visível, e Josh estava recuando vagarosamente. No meu aperto estava o meu amuleto, mas parecia como se eu não o tivesse realmente. Grace estava olhando diretamente para mim, sua expressão assustada.

Um voizinha em mim dizia que algo não estava certo, mas eu não tinha tempo para pensar nisso, e eu estiquei a mão para o amuleto de Nakita.

“Madison, não!” Grace gritou, mas era tarde demais.

“Hey!” eu uivei quando Nakita casualmente agarrou meu punho com sua mão livre. “Você não devia ser capaz de me ver,” eu disse estupidamente, chocada enquanto olhava para ela.

Josh estava branco, claramente me vendo também. Eu não entendia! Eu conseguia ver meu amuleto na minha imaginação, os fios sendo cortadas enquanto mudavam do futuro para o presente, mas eu estava visível!

Seus lábios grossos se curvaram num sorriso, e Nakita me puxou para mais perto, curvando seu braço ao redor do meu pescoço e prendendo as minhas costas nela.

“Eu não sei o que está tentando fazer, mas pare de se aproveitar do meu amuleto, sua sucubuzinha!”

Seu amuleto? eu pensei, então percebi o que tinha acontecido. Exatamente como quando eu estivera morta no necrotério e o amuleto de Barnabas tinha me prendido ao presente, o da Nakita estava fazendo isso agora.

Burra, burra, burra! Eu me repreendi. Eu podia ser capaz de ver a Grace, mas eu não estava inteiramente invisível.

Droga!

Imediatamente eu parei de destruir as cordas, e Grace se tornou uma bola turva de luz.

Nakita ainda me tinha, e eu tentei sair de seu aperto, em vão.

“Solte-a!” Josh gritou enquanto pulou em cima de nós.

Deus, não!

Nakita desvencilhou-se do giro de Josh, desequilibrando-me. Antes que eu consegui ficar de pé, ela deu um chute, atingindo-o em seu plexo solar. Josh voou para trás, um som feio escapando dele enquanto caia de joelho ao lado da minha câmera abandonada e tentava respirar. Seus olhos estavam arregalados, e suor
emplastrava de seu cabelo até seu rosto. Nakita era um bocado mais forte do que parecia.

“Está bem. Você me pegou. Deixe-o em paz,” eu disse ofegante enquanto olhava primeiro sua espada, então seu amuleto, há centímetros de mim.

“Kairos quer te ver,” ela disse, seus olhos azuis pálidos parecendo frios. “Aparentemente há um pequeno problema sobre juntar sua alma e corpo e a minha gadanha.”

Droga, eu pensei, tentando me desvencilhar. Isso não era nada bom. “Prometa-me que irá deixar o Josh em paz,” eu disse, esticando minha mão pelo braço dela na minha garganta até que minhas pontas dos dedos roçassem a pedra fria ao redor de seu pescoço. Nada aconteceu. Se eu conseguisse tocá-la, eu conseguiria pegá-la.

Contanto que eu não a reivindicasse, eu ficaria bem.

Ela sorriu e me deslocou para longe, de modo que as minhas pontas dos dedos escorregassem.

“O seu amigo morre primeiro,” ela disse. “Kairos está dois dias mais velho do que na semana passada, e ele está mal-humorado.”

Eles me pegaram, e ela vai gadanhar Josh de qualquer maneira? Eu pensei. Então eu arfei novamente quando Nakita me empurrou e foi voando para frente, os braços e pernas descontrolados. Eu atingi o chão arduamente ao lado de Josh. Meu olhar se moveu para as árvores, e eu estiquei minha mão para ajudar Josh a se levantar, aterrorizada pela extensão negra gotejante que eu via. Asas negras estavam voando pelos galhos e circulando a árvore. Elas podiam despir a minha alma e me destruir completamente. O que estava atraindo-os?

Tanto o meu amuleto quanto Grace estavam escondendo as nossas auras! Não estavam?

Eu olhei para cima para ver Nakita sorrindo maliciosamente, mostrando seus dentes perfeitos. A ponta afiada de sua lâmina cintilou, e quando ela deu o bote em Josh, eu rolei, batendo em sua pernas.

Esperneando, ela caiu em mim. Eu lutei para pegar seu amuleto, e ela me empurrou, girando para ficar de pé.

“Madison, tira as labaredas do caminho!” Grace gritou.

Josh resmungou. Eu fiquei de pé, procurando-o. Ele estava deitado de costas, encarando o alto.

A lâmina de Nakita estava exposta e brilhando numa coluna de luz.

“Josh!” eu gritei, e eu quase chorei de alívio quando ele se deslocou para rolar e ficar com seus braços debaixo de si. Ele não estava morto. Mas ele estava machucado. Ela o tinha cortado?

Nakita franziu de repente, claramente não feliz. Uma asa negra voou entre Josh e eu, e meu medo ficou tão intoxicante que eu quase consegui sentir seu gosto. Elas estavam ficando mais ousadas. Eu não podia deixá-las tocarem-no. Grace se abaixou. Eu fiquei tensa quando ela se encontrou com uma, e ela desapareceu em
um brilho de luz lateral. Eu teria aplaudido, mas outra tomou seu lugar.

“Kairos me contou como você roubou o amuleto dele,” Nakita disse, e minha atenção foi até ela enquanto ela ficava de pé do lado da caminhonete com sua lâmina exposta. “Isso foi um erro. Não vai apenas acabar com a sua vida, como destruir a sua alma. O garoto está morto. Hora de ir.”

Vendo Nakita sorrir enquanto a mais ligeira das brisas deslocava seu longo cabelo, eu senti meu medo virar raiva: raiva por ela achar que eu iria mansamente para o meu fim, raiva por ela ter machucado o Josh, raiva por ela ser mais forte que eu, e raiva por tudo que eu aprendera ontem não ter significado nada.

“Eu gostaria de ver você tentar me pegar,” eu disse, caindo em um meio-agachamento.

Nakita riu, sua voz lançando as últimas asas negras no ar. “Você não tem escolha. É o destino,” ela disse, a música feliz da banda nos fundos um contraste nítido à suas ameaças. “Você não deveria ter essa pedra. Você deveria estar morta. E com você tendo ido embora, nós todos podemos voltar ao jeito como as coisas eram. Do jeito que tem sido por milênios.”

“Exceto que eu estarei morta,” eu disse, e ela deu de ombros.

“Você pode simplesmente me dar a pedra agora,” ela disse, a fina mão estendida.

“Acho que não,” eu disse, e seus olhos se espremeram.

Grace caiu ao meu lado, e eu acenei para que ela fosse para longe. “Fique com o Josh!” eu exigi.

“As asas negras não estão atrás dele,” ela protestou. “Eles estão atrás de você! Madison, não fique mais invisível. Você está rachando seu amuleto. Está quebrando. Eu te disse que era perigoso. É apenas o amuleto da Nakita mantendo-os longe de você agora.”

É apenas o amuleto da Nakita me impedindo de ficar nebulosa e que esse plano podre meu funcione, eu pensei, então hesitei. Se o amuleto dela estava me prendendo ao presente, então por que eu não poderia quebrar meus laços com o amuleto da Nakita como os meus próprios?

“Madison, não!” Grace disse, como se soubesse o que eu ia fazer.

“Fique com o Josh,” eu insisti, e seu brilho redobrou de frustração.

Nakita veio até mim e eu recuei, lutando por tempo e espaço para bolar como me desconectar de seu amuleto. Eu não conseguia sentir uma conexão, mas tinha que estar ali.

E eu não podia lutar com ela e encontrá-lo ao mesmo tempo.

Eu olhei para Josh ajoelhando-se no chão com sua cabeça abaixada. Eu pensei no meu pai e como eu queria vê-lo novamente. Eu pensei nas pessoas vivendo suas vidas, de momento em lindo momento, capturadas pela minha câmera, ignorando o presente que lhes fora dado. Eu não estava pronta para partir. Eu tinha que encontrar uma maneira de fazer isso funcionar, para fazer uma conexão mais forte entre o amuleto da Nakita e eu mesma para que eu pudesse quebrá-la – e eu tinha que fazê-lo sem reivindicar a coisa mortal.

Fechando meus olhos e rezando para não estar cometendo um erro, eu deixei ela me tocar.

Eu endureci quando sua mão beliscava o meu ombro. Indo de bom grado para a inconsciência, eu deixei a existência do meu amuleto encher a minha visão mental. Ao lado estava uma outra presença, muito mais fraca. O amuleto de Nakita tinha muito menos fios até mim, mas enquanto eu observava, o número crescia, me tornando mais sólida, mais real. Mais morta, eu pensei, tentando cortar as linhas entre nós, e só tendo sucesso em arrancar as linhas de mim até meu amuleto.

Nakita sentiu isso e deu um solavanco, mas sua mão ainda estava em mim e eu não estava invisível. Eu não podia cortar as linhas do amuleto dela para mim sem controlá-lo, e eu não podia controlá-lo a não ser que o reivindicasse. Faça isso, e você será pó. Mas a espada dela, eu pensei repentinamente. Era feita do amuleto
dela. Uma conexão direta com ele. Talvez se eu trabalhasse por ela...

O som de surpresa da Nakita abriu meus olhos. Grace estava acima de Josh, banhando-o em um nevoeiro de luz. Ela era linda e selvagem, uma beleza dura que doía ao olhar. E ela estava chorando. Chorando por mim.

Eu tentei dizer a ela que ficaria bem, mas eu não conseguia pensar nas palavras.

Algo caiu em mim, fazendo-me vacilar. Eu teria caído se não pela Nakita me segurando. Eu encontrei os olhos dela, e eles se arregalaram. Seus lábios se abriram, e terror cruzou seu rosto.

Uma dor inesperada e arrebatadora me endureceu. Eu cai em cima de um joelho quando Nakita me empurrou para longe. Em terror repentino, eu percebi o que era.

Asas negras. Asas negras tinham me achado.

Frio tão intenso que parecia que fogo tinha sido empurrada da minha espinha para a minha mente. Eu arfei, incapaz de gritar. Não era morte. Era a sensação de nunca ter existido, de nunca ter sido. As asas negras estavam tomando as minhas lembranças e deixando um vazio no lugar. Estavam me destruindo, despindo-me
do meu passado, momento por momento.

Instinto me empurrou de volta para a terra. Frenética com dor, eu tentei arrancar as asas negras, torcendo. Eu as alcancei para me livrar delas, mas a extensão fria pairava como uma segunda pele sugadora. Estava comendo a minha alma, queimando onde eu a tocava com as minhas mãos!

Eu fiquei de pé, agonia em cada movimento. Eu me levantei, cambaleando enquanto outra caia em mim.

Chocada, eu não conseguia fazer nada. A dor tinha me mudado de volta a visibilidade – eu não conseguia nem ver meu amuleto, muito menos as linhas da conexão – e, vacilando, eu olhei para Nakita. Eu tinha falhado. Eu tinha cometido um erro, e ia morrer. A esperta e linda Nakita tinha ganhado o meu fim e a pedra
sem esforço algum. Se eu não fizesse nada, minha existência seria comida. Eu deveria estar feliz. Eu tinha tido um verão extra de vida. Mas não era o bastante, e eu recusava o meu fim, mesmo o vendo. Tudo que eu precisava era da maldita da espada dela. Se conectava diretamente com seu amuleto, e através dela, eu tinha
certeza que eu conseguiria cortar os fios que estava fazendo comigo.

“Você pode ser uma ceifadora negra,” eu disse enquanto meus membros pareciam ficar entorpecidos, “mas você não sabe porcaria alguma sobre determinação humana.”

Ela pestanejou, os olhos arregalados e confusos. Cerrando meus dentes, eu fui até ela.

Dois anos de prática entraram em ação, e eu plantei meu pé esquerdo no chão ao lado do direito dela, então girei para ficar de lado próxima a ela, meu cotovelo direito balançando com todo meu ímpeto em direção ao seu meio. Eu atingi o estômago de Nakita forte. Ela se inclinou para frente, os músculos atacando.

Sua lâmina ficou frouxa, e eu a agarrei sobre seus dedos. Era minha e dela também. Na minha imaginação, eu conseguia ver nossos dois amuletos e todas as linhas me segurando para o agora.

Percebendo que eu estava tentando tomá-la, Nakita colocou sua mão acima da minha que estava agarrando sua espada. Ambas a seguramos. Eu tinha que ficar nebulosa. A espada viria comigo se eu ficasse. Mas doía.

Se eu não conseguisse fazer isso, Josh morreria. Eu não deixaria ele morrer só porque eu estava com medo da dor. A decisão era fácil.

Minha mão doía sob o aperto da ceifadora. Eu cedi a dor. Eu deixei ela me lavar e me levar, deixando-me limpa de tudo, exceto minha determinação. Euforia subiu, uma embriaguez falsa enquanto a minha mente tentava se proteger. Alegre e poderosa, eu exalei, explodindo os laços me conectando ao presente – e com o
sopro da minha determinação, todos eles murcharam como fios de seda em chamas. A espada dela era minha.

“Não!” Nakita berrou, recuando enquanto sentia sua lâmina ficar invisível comigo. Eu era a névoa, e ela não conseguia me segurar, mas ela se propeliu como se pudesse. Instinto trouxe minha mão para cima, e a ceifadora passou diretamente por mim, seu amuleto flamejando como uma chama violeta.

O rosto de Nakita ficou surpreso, e sua boca abriu-se em um grito silencioso. Era como se o tempo tivesse ficado devagar, e eu segurei minha respiração para não respirar nela. Eu comecei a me enrugar, sentindo sua raiva fria, sentindo o gosto de sua frustração, vendo na minha mente Kairos de pé num chão de telha preta ao
sol e dizendo a ela que eu era uma ameaça às vontades dos serafins e mandando-a secretamente atrás de mim. Por um instante, eu era ela. Eu era Nakita – e ela era eu.

As asas negras anexadas a mim a sentiram também. E elas encontraram algo melhor para comer do que a minha reles memória de dezessete anos.

Nakita gritou em agonia enquanto as asas negras me soltavam e clivavam nela, ao invés. Dor levantou-se de mim enquanto eles partiam da minha alma, embutindo-se dentro da ceifadora enquanto ela passava por mim.

Eu atingi o chão, e o choque quebrou meu aperto mental nos amuletos. Linhas explodiram em existência, duas pedras me prendendo ao presente. Eu era novamente sólida. Nakita ficou de pé acima de mim, dura com dor. Na minha mão não estava sua espada, mas seu amuleto. Ao pegar um, eu tinha pego ambos.

Sua voz alta de agonia, Nakita caiu para se ajoelhar sobre o chão. Suas asas brancas cintilaram em existência, esticando-se para os galhos altos. Eu corri para trás até o Josh, aterrorizada. Josh olhou para cima, uma mão em seu tronco enquanto ele observava, tremendo enquanto Grace novamente se tornava uma
bola de luz brilhante acima de nós.

Um terceiro grito perfurante veio de Nakita. Não soava humana, e medo gelou as minhas veias.

Ela tinha asas negras dentro dela. Eu encarei, horrorizada, enquanto eu percebia o que tinha feito. Mas eu não sabia. Eu não sabia!

Suas asas e costas arquearam-se novamente no que deve ter sido uma dor horrorosa, e seu choramingo foi cortado com uma subtaneidade assustadora enquanto, com um empurrão de asas para baixo, ela desapareceu. Recortes de terra e grama voaram, e eu me encolhi de medo.

“Madison,” Grace disse, sua voz aterrorizada clara sobre o barulho da banda de ensino fundamental. “Entre na caminhonete. Pegue o Josh e entre na caminhonete.”

Nakita tinha ido, mas as asas negras ainda estavam abundando. Havia centenas delas. Eu estava sólida, e Grace estava conosco, mas elas não estavam dissipando.

“Josh,” eu ofeguei, sentindo-me tonta e insubstancial. Tropeçando, eu ajudei-o a ficar de pé, o amuleto de Nakita enrolado ao redor do meu pulso.

Recuando para o lado, eu peguei a minha câmera, esquecida no solo. A porta da caminhonete estava aberta, e eu o empurrei para dentro, fazendo-o escorregar para o lado do passageiro. Ainda estava correndo, e eu agradeci a Deus pelos pequenos favores.

“O Josh está bem?” eu ofeguei enquanto fechava a porta com tudo. O câmbio duro parecia que estava entrando diretamente nos meus ossos. “Ela atingiu ele?”

“Não foi um golpe limpo,” Grace disse. “Eu teria parado-a completamente, mas você entrou no caminho. A alma dele está pendendo por um fio. Caia fora daqui. Eu não consigo parar um esforço concentrado se eles atacarem juntos. Estou te escondendo, mas dois te provaram, e os outros sentem isso. Não fique invisível
novamente. Madison, não fique invisível! Você está despedaçando o seu amuleto um pouquinho mais cada vez que faz isso.”

Eu estava tremendo enquanto recuava a caminhonete e então colocava na primeira marcha. Josh estava desmoronado contra a porta do passageiro. Não fique invisível. Grace tinha dito isso antes. Que atraia as asas negras. Mas eu não tivera escolha.

“Josh?” eu disse enquanto encontrávamos a calçada e eu diminui a velocidade para um rastejar enfurecido para evitar as pessoas que estavam só agora começando a abandonar o parque.

“Josh, fala comigo.” Eu olhei para trás de mim, mas era como se ninguém tivesse escutado Nakita gritar.

Ninguém tinha visto uma anjo com asas arquear de par em uma beleza terrível sob as árvores.

Eu me estiquei para sacudi-lo, e ele resmungou. “Hospital,” ele sussurrou. “Madison, eu sinto como se estivesse morrendo. Me leve lá. Por favor.”

Medo me penetrou. Eu passei para a estrada principal, e então eu fui com tudo.

Deram buzinadas, e eu liguei as luzes de alerta, pelo bem que elas fariam.

Quando meu pai descobrisse sobre isso, ele ia me matar. De novo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário